" repare bem no que não digo / da estante

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

repare bem no que não digo



para Wil

Na agonia de não ter para quem escrever, escrevo para você. Gosto de escrever cartas que nunca irei enviar. Gostaria de ter disposição para enviar cartas e não só para escrevê-las. Escrever assim me dá a sensação de libertação mas também aprisiona sem sentido pois quem lê nunca terá certeza se é sobre si. Bom, espero que tenhas essa certeza, Wil, pelo menos pelos próximos instantes.

Uma das melhores coisas em escrever sobre pessoas que te cercam é imaginá-las lendo e se perguntando se aquele texto é sobre elas. Não é uma espécie de brincadeira. Minto, talvez seja. No meu tempo de menina adorava escrever sobre o que me acontecia. Não era como escrever num diário, era mais como dissertar sobre os acontecimentos e as pessoas por quem estava apaixonada no momento. Na primeira, na segunda ou na terceira pessoa. Sempre com começo e meio. Nunca com fim.

Hoje em dia, escrevo mais bobagem, até sobre o café que deixei queimar na chaleira. Quem ainda faz café na chaleira? Eu faço. E gosto. E não trocarei o termo porque é chaleira mesmo, minha vó ensinou assim. Mas o fato é que temo estar me bestificando. Temo que o tempo me bestifique até o momento em que não terei o menor tesão em mistificar ou intelectualizar os textos. Estão cada vez mais banais mas sinto que cada vez mais... Não sei a palavra certa. Estão cada vez mais sobre o bê a bá, cê a cá, dê a dá... Dane-se. Não você, claro.

Semana passada estive numa crise de mim - sim, porque não sei se é crise de identidade da casa dos vinte, se posso chamar de crise que o capitalismo traz à medida que o tempo passa, se posso chamar de crise após cada leitura de Nietzsche, se posso chamar de crise qualquer leitura de aulas de Foucault -, não sabia se ouvia música ou se lia um livro. E olhe que tenho incontáveis livros para ler e concluir trabalhos pendentes! 

Repare bem no que não digo. Li isso em algum lugar, mas isso não vem ao caso. Na verdade, repare que o tempo vai nos fazendo ficar mais propensos ao tédio e não que ache ruim, às vezes gosto de estar entediada mas o problema é o que sai desse tédio. Esse bê a bá descompassado. Essa distopia desenfreada da realidade. Talvez você me saiba dizer, Wil. Talvez você entenda melhor que eu. Repare bem no que não digo. Até agora não disse nada. 

Então, repare no que digo. Não carregar os textos de melancolia seria sinal de amadurecimento? Certamente Schopenhauer discordaria e não quero aqui me elevar a ele, longe de mim, embora adore uma fossa. Que amadurecimento podre seria, hein? Eu já nem sei mais o que dizer aqui, meu descontentamento vai a mil e eu só queria que você me dissesse algo sobre essas banalidades que nos fazem despender tempo descrevendo-as e desentranhando algum suspiro de sentido desse cotidiano absurdo que nos acompanha dias afora.  

2 comentários

  1. D'Gleyze, ainda estou lendo. Comentarei quando acabar...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ain't no sunshine when she's gone
      Its not warm when she away
      Ain't no sunshine when she's gone
      And shes always gone to long
      Anytime she goes away

      Wonder this time where she's gone
      Wonder if she gonna stay
      Ain't no sunshine when she gone
      Cuz this house just ain't no home
      Anytime she goes away.

      And I know I know I know I know
      I know I know I know I know I know
      I know I know I know I know I know I know
      I know I know I know I know I know I know
      Ya I outta leave that young thing alone
      But ain't no sunshine when shes gone

      Only darkness everyday
      Ain't no sunshine when shes gone
      And this house just ain't no home
      Anytime she goes away

      Ain't no sunshine when she's gone
      Its not warm when she away
      Ain't no sunshine when she's gone
      And shes always gone to long
      Anytime she goes away

      (I know I know I know I know I know)
      Anytime she goes away
      (I know I know I know I know I know)
      Anytime she goes away

      (I know I know I know I know I know)
      Anytime she goes away
      (I know I know I know I know I know)
      Anytime she goes away

      Excluir

© da estante
Maira Gall