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quinta-feira, 7 de maio de 2015

aos que não pensam na vida





Os que pensam pouco na vida vivem mais felizes. Eles não quebram cabeça com questões que tiram o sono, eles dormem bem.
Eles viajam e conversam e cantam. Eles ouvem músicas sem pensar no que o compositor sentia quando escreveu, ou sem imaginar mil histórias vividas ou não para a mesma canção. Eles assistem a filmes dos anos 70 ou 80 e não ficam com cara de bobos ou voltam inúmeras vezes a mesma cena para ouvir de novo o diálogo que mexeu com suas estruturas mentais. Eles não veem tantos filmes dos anos 70 e 80. Eles não ficam entre mil amores tentando entender qual deles correspondem ao descrito por Bauman em Amor Líquido, porque os que não vivem pensando na vida simplesmente seguem o instinto. 
Eles não escrevem e por isso não se martirizam se não escreveram logo aquela estória ou registraram aquela ideia, porque simplesmente eles não a pensaram. Eles não perdem tempo com isso e são mais felizes. 
Eles não passam o tempo decidindo o que é certo e errado ou se essa dicotomia de fato existe, eles não gastam bom tempo de vida a pensar nisso. Eles têm coisas mais importantes para fazer do que pensar em questões que provavelmente não irão resolver. 
Eles agem por impulso. Não passam maior parte do tempo de vida pensando no que fazer, no como fazer, no porquê fazer, no dever fazer. Eles não se pressionam e se impressionam tão fácil. 
Acho que descobri a receita para ser um tanto mais feliz: não pensar tanto. E no entanto, é uma receita que não pretendo seguir.

ainda sou um sim



A essa hora da vida, 
ainda sou um sim.
Sinto a força pulsar no meu peito,
correr em minhas veias.

Fecharam-se as feridas
e o sangue estancou.
Nenhuma dor há de durar.

Somos o indefinido.
A metafísica de que falava
o guardador de rebanhos.
O silêncio manso no olhar da mãe,
o brilho no olhar do filho
e o mundo à nossa porta,
como oxigênio aos nossos pulmões.






J. G.
07/07/2014

Sinto um gosto amargo...

Sinto um gosto amargo na boca
uma dor perfurando a alma que agora
sei que existe
sinto a dor de perder-se por dentro
que me ataranta os sentidos
e desfaz meus pensamentos
uma dor que sufoca
arranca-me o ar
fecha-me os poros
e dói, dói, dói!

Necessariamente nessa intensidade
nessa desordem que afugenta a paz
que nunca tive.
Sinto o sangue fugir para algum lugar
desconhecido do meu corpo
e lágrimas vêm beirar meus olhos
antes cortassem minha pele
em tiras miúdas
e tanto não doeria!
Pois é pior, bem pior.
Não há como suportar
uma dor assim
perder o filho que não nasceu
abortar um poema
e estar condenado a esta dor sem fim.
Perdi palavras que saíram de mim
e nem foram para o mundo
do lado de cá
Perdi! Outros perdi, tanto me doeram
mas não assim
doendo, doendo, doendo!
Necessariamente nessa intensidade
nessa desordem que se fez em mim
desde que perdi.

27/04/2015
J. G.
© da estante
Maira Gall